História dos Termômetros e das Escalas

UM POUCO DE HISTÓRIA DOS TERMÔMETROS E DAS ESCALAS TERMOMÉTRICAS (1)

Texto cedido pelo professor Luis Carlos Gomes, professor do Colégio Militar de Porto Alegre - RS


Podemos dizer que a temperatura (2) é uma grandeza que nos permite constatar se uma substância está quente, morna ou fria. Mas o que entendemos por quente ou frio? Quando dizemos: “Hoje está um dia muito quente”, estamos usando como parâmetro o sentido do tato e nos referindo à temperatura com a qual estamos familiarizados. Portanto, só faz sentido falar de quente ou frio em relação a um determinado parâmetro. Esse parâmetro pode ser, por exemplo, nosso sentido de tato, a temperatura do gelo, a temperatura do Sol, etc.

Mas será que o nosso sentido conhecido como tato é capaz de discernir entre duas temperaturas realmente diferentes? Para exemplificar, podemos utilizar uma situação bastante simples proposta pela primeira vez há muito tempo atrás: vamos aquecer um pouco de água em um recipiente A e colocar água da geladeira em um recipiente B. Num terceiro recipiente, C, colocaremos água da torneira à temperatura ambiente. Se ficarmos durante alguns instantes com uma mão segurando o copo A de água quente e com a outra o copo B de água gelada e, após, imediatamente, colocarmos as duas mãos no copo C, com água a temperatura ambiente, qual a sensação que devemos ter?

O estudo sobre a temperatura, essa grandeza de fundamental importância para nossa vida, nos levará também a conhecer um pouco da História da Ciência, a fim de compreendermos as formas como, atualmente, expressamos o valor da temperatura de um corpo.

A medida e o controle da temperatura nos dias atuais, desempenha um papel muito importante. Nas indústrias, nos laboratórios científicos, na medicina e até mesmo em nossas casas, nas lidas domésticas, estamos constantemente fazendo uso de termômetros para medir e controlar a temperatura de uma grande variedade de objetos, nas mais diversas circunstâncias.

As técnicas usadas no estabelecimento de escalas termométricas e na construção de termômetros vêm sofrendo uma grande evolução a partir do século XVI. O primeiro termômetro de que se tem notícias foi construído por Galileu Galilei, em 1592. O aparelho de Galileu consistia em um bulbo de vidro terminado por um tubo fino, cuja extremidade era introduzida em um recipiente com água colorida. Antes de emborcar o tubo na água, Galileu aquecia um pouco o bulbo de vidro para expulsar o ar aí contido. Então, mergulhando o tubo no recipiente, quando a temperatura do bulbo retornava ao seu valor inicial, a água subia no tubo, forçada pela pressão atmosférica, até uma certa altura. Evidentemente, o aparelho assim construído permitia comparar as temperaturas de objetos colocados em contato com o bulbo, pois a altura da coluna de água é tanto menor quanto maior for a temperatura do bulbo.

O aparelho de Galileu não era propriamente um termômetro, pois, na realidade, ele permitia apenas a comparação de duas temperaturas e, por isto, devemos denominá-lo de “termoscópio de Galileu”. Pouco se sabe sobre a escala de medida de Galileu, mas seu aparelho proporcionou a outros a base para prosseguir.

Alguns investigadores descobriram que a pressão atmosférica, variando com a altitude do lugar e com as condições atmosféricas, afetava a altura da coluna medidora do termoscópio de Galileu e, por isso, não se mostrava um instrumento muito confiável. Na tentativa de se evitar tal imprecisão, um médico francês chamado Jean Rey (? – 1645) inverteu o arranjo feito por Galileu enchendo o bulbo com água e o canudo com ar, notando, então, a expansão do líquido como medida da temperatura. Rey declarou que as mãos de um paciente com febre faziam subir a água no tubo como reflexo do “calor do seu corpo”.

O instrumento de Rey era impreciso porque a evaporação pelo topo aberto do tubo afetava a altura da água, com o passar do tempo.

Alguns anos mais tarde um grão-duque toscano, Ferdinando II, num esforço para construir um aparelho melhor para medir temperaturas inferiores ao ponto de solidificação da água, levou membros de sua “academia del cimento” a uma série de experiências nos famosos laboratórios florentinos. Para tanto, tiveram a idéia de usar espírito de venho (uma forma não refinada de álcool) em vez de água, pois o álcool se congela a uma temperatura bem mais baixa que a água (em torno de –118 oC). Para evitar a evaporação do álcool, ele teve a idéia de fechar hermeticamente a parte superior do tubo, construindo, assim, um termômetro realmente igual aos que usamos na atualidade.

O Duque Ferdinando II contribuiu enormemente para o desenvolvimento da termometria, fundando em Florença uma academia especializada na construção de termômetros. Os habilidosos especialistas que trabalhavam nesta academia foram os primeiros a usar mercúrio metálico como líquido termométrico. Estes termômetros florentinos foram amplamente usados por mais de cem anos e ainda hoje é possível encontrar alguns exemplares destes aparelhos.

O que todos os instrumentos primitivos necessitavam, afinal, era de uma escala que pudesse ser considerada “certa”, confiável, com um ponto alto e um ponto baixo como referência, baseados em algum fenômeno natural que sempre ocorresse a uma mesma temperatura e a uma pressão atmosférica constante.

Como a graduação utilizada pelos termômetros florentinos podia ser feita de maneira totalmente arbitrária, foram surgindo várias escalas, bastante diferentes umas das outras. Cada país adotava sua própria escala e, muitas vezes, cientistas diferentes de um mesmo país trabalhavam com escalas diferentes. No início do século XVIII, esta proliferação de escalas termométricas era tal que existiam mais de 35 escalas em uso. Para termos uma idéia, os florentinos haviam escolhido o frio do inverno e o calor do verão como seus pontos baixo e alto. Por “frio do inverno” eles queriam dizer a temperatura da neve ou do gelo na mais severa das congelações. Por “calor do verão” eles tomavam a temperatura do corpo de uma vaca ou de um veado. Um outro termometrista primitivo tomou, igualmente, dois padrões variáveis: a temperatura da fusão da manteiga como ponto alto e a temperatura do ar durante o congelamento como ponto baixo.

Coube a Daniel Gabriel FAHRENHEIT (1686 – 1736), em 1724, a escolha de um ponto alto e um ponto baixo, os quais, se não eram perfeitos, estavam pelo menos próximos de serem invariáveis. Ele tomou como ponto baixo a temperatura dos dias mais frios de sua terra natal (Danzig, na Holanda), reproduzida através de uma mistura bem determinada de gelo, sal, amônia e água. Como ponto alto escolheu a temperatura de uma pessoa (que, no caso, era sua esposa). Para ponto baixo ele estabeleceu, arbitrariamente, o valor “zero” e para ponto alto, também, arbitrariamente, estabeleceu o valor 96! (3)

Assim, usando mercúrio metálico (Hg) como fluido expansivo, como substância termométrica dentro do termômetro e, tomando como base a escala construída a partir dos pontos alto e baixo citados anteriormente, Fahrenheit pôde verificar que, na sua escala, o gelo puro fundia-se à temperatura fixa de 32oF e que a água pura fervia à temperatura fixa de 212oF. Com isto, em suas anotações, Fahrenheit declarou modestamente:

“. . . talvez imperfeito em muitas coisas, o resultado atendeu às minhas preces e com grande prazer mental observei a verdade da coisa.”

Os padrões estabelecidos por Fahrenheit foram, posteriormente, aperfeiçoados por outros cientistas. Um deles, o sueco Anders CELSIUS (1701 – 1744), sugeriu que se tomasse o zero como ponto de ebulição da água e o 100 como o de congelamento (não se espante!). Mas logo esta escala foi invertida de cabeça para baixo, com o ponto de ebulição em 100oC e o de congelamento em 0oC, como a utilizamos até hoje.

Uma outra escala termométrica bastante usada, principalmente pelas ciências, é a escala Kelvin, criada em 1848 e assim denominada em homenagem ao físico inglês Willian Thompsom, o Lord KELVIN (1824 – 1907). Nesta escala, o gelo funde-se a uma temperatura de +273K e a água ferve a +373K, aproximadamente (4). Esta escala, também denominada de escala termodinâmica (5) tem seu zero (O K) com valor correspondente a –273oC. Esta temperatura, conhecida como o “zero absoluto”, é a temperatura mais baixa, jamais atingida no Universo, que se tem conhecimento.

Atualmente, as técnicas de medida de temperatura estão altamente desenvolvidas. Os termômetros de mercúrio metálico, como você sabe, são ainda amplamente utilizados, mas vários outros tipos de termômetros e novos processos de medida de temperatura foram criados: alguns que permitem obter medidas de alta precisão, outros capazes de medir temperaturas extremamente baixas (próximas do zero absoluto), outros ainda destinados a fornecer valores de temperaturas muito altas (como a temperatura de uma reação nuclear, que pode atingir cerca de 1200 ºC) e mesmo dispositivos que fornecem a temperatura de objetos muito afastados de nós (como a temperatura da superfície do Sol, em torno de 6.000oC).

(1) Reprodução autorizada E|F (R).
(2) Texto adaptado de ALVARENGA, Beatriz & MÁXIMO, Antonio. Curso de Física. Vol.2.São Paulo: Harper & Row do Brasil, 1986.
(3) Por que “96” e não “100”? Na Europa não era utilizado o sistema decimal de contagem. Utilizava-se um sistema múltiplo de 6.
(4) Os valores considerados exatos e adotados em 1954 pela Décima Conferência Geral de Pesos e Medidas, em Paris, são de 273,15K e 373,15K, respectivamente. Os valores exatos são utilizaods para efeitos de cálculos em problema e exercícios.
(5) Atualmente denominada de escala absoluta, com as respectivas temperaturas absolutas.

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